A geração colorida
Como o consumo e a tecnologia possibilitaram o surgimento de uma garotada que vê o mundo com o filtro do rock feliz, o que pensam esses adolescentes e por que a rebeldia poderá libertá-los
Maria Carolina Maia e Renata Megale
Modelos: Thomas (bateria), Pe Lu (guitarra e vocal), Pe Lanza (baixo e vocal) e Lucas (guitarra e vocal): os meninos do Restart, que em 2010 ganharam cinco prêmios no Video Music Brasil, da MTV, têm entre 18 e 21 anos e se dizem "família"
Eles se vestem com roupas de cores gritantes, desenham corações com caracteres na internet e dizem que são parte de uma mesma família. A fofura é a marca dessa geração colorida, que tem entre 10 e 14 anos e é fã de rock feliz – que eles fazem questão de chamar pelo nome em inglês, happy rock. Para os pais que já não agüentam os ringtones de bandas como a americana All Time Low e as brasileiras Cine e Restart, o fenômeno que vendeu mais de 100.000 discos e agora vai ganhar livro e filme, um consolo: a rebeldia teen, que eclode juntamente com a explosão dos hormônios, provavelmente os libertará.
Os fãs do rock feliz pertencem à chamada geração Z, dos nativos digitais. Ela cresce dentro de casa, explorando o mundo pelo computador, um recurso que a tecnologia e o consumo proporcionam. Não por acaso essa é uma geração de fofos. São meninos e meninas protegidos, com motivos para a ver a vida em cor de rosa. Ou azul, ou verde, ou vermelho, ou amarelo - na verdade qualquer cor, desde que seja cítrica. A geração também é produto de um mundo politicamente correto, sustentável, saudável. Um mundo onde todos querem se destacar por fazer o bem: Bono, do U2, arrecada dinheiro para a África, Angelina Jolie adota crianças nos confins do mundo, as novelas têm merchandising social.
Os ídolos eleitos por essa turma são muuuuito certinhos. Boa parte deles é criada pela Disney. A empresa é especialista em fabricar conteúdo infanto-juvenil politicamente correto. Não à toa, algumas de suas estrelas sofrem para se desvencilhar da imagem de correção que carregam, ao deixar a adolescência. É o que vem acontecendo com Miley Cyrus, do seriado Hannah Montana.
Coração, cores e rock feliz – Para Maria Marta Battistoni, professora de Psicologia da Unicamp, a fofura é um modo mágico de negar as tristezas do início da adolescência, quando o confortável status de criança é perdido, e adiar as responsabilidades que começam a surgir na adolescência. “A formação de grupos com desse tipo, que compartilha gostos ingênuos, favorece o controle mágico da passagem do tempo, é quase como um prolongamento da infância”, diz a psicóloga, que atende no Ambulatório de Psicoterapia de Adolescentes da Unicamp.
Maria Marta lembra que a garotada está entrando mais cedo na adolescência - outro efeito da exposição ao consumo das classes médias. "O que esses meninos recebem de informação pelas mídias e pelos meios digitais é incrível", diz. A psicóloga destaca ainda outra característica dessa fase: a ilusão de eternidade. Os adolescentes que enviam mensagens para o Restart e outros ídolos teen pela internet colocam juras de amor eterno ao lado dos já típicos S2 ou <3 (um olho não treinado certamente não viu, mas há coraçõezinhos escondidos na combinação de caracteres).
Na verdade, eles confundem eternidade com intensidade nos sentimentos. Uma intensidade que é natural e que pode ser benéfica. Quando um pré-adolescente elege algo, ele se lança com paixão e se aprofunda no assunto, o que lhe permite transcender a superficialidade geralmente imputada à geração dos nativos digitais.
A rebeldia os libertará – De acordo com Maria Marta, da Unicamp, a negação das tristezas e responsabilidades é um tipo de rebeldia, mas ainda embrionária, e típica dessa faixa etária, assim como a formação de uma família feita de amigos. “Essa é uma fase de rebeldias amenas, geralmente direcionadas à família verdadeira, mas nem sempre conscientes: eles ainda não têm uma ideologia”, diz a psicóloga.
É em geral numa idade mais avançada, por volta dos 16 ou 17 anos, que os adolescentes se rebelam de vez. “Nessa fase, a personalidade sofre oscilações, muda muito”, diz Maria Marta. “Com o tempo, eles vão encontrar caminhos mais próprios, mais autênticos. Depois, vão até sentir vergonha de ter gostado de determinado artista.”
A opinião não é unânime, mas certamente algum pai vai agora dizer: "Amém".
Disponível em
http://veja.abril.com.b
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